quinta-feira, agosto 17, 2006

Pregões

O Verão tem o dom especial de nos presentear com alguns pregões típicos e outros até mais espontâneos. Não importa para onde vás, sempre encontrarás neste jardim à beira-mar plantado um cromo devidamente apetrechado com um pregão feito à medida e para a ocasião. Assim aconteceu comigo e com a minha mulher por um destes dias estivais, bem acalorados. Passeávamos na marginal da Póvoa, junto ao mar, resolvemos tomar um refresco bem geladinho numa das imensas esplanadas que se estendem pelo areal fora e quem estava lá em conversa animada e galhofa persistente? Nada mais nada menos que o Filipe e alguns foliões das danças de salão...

Já entusiasmados pelas caipirinhas abundantes e pela cerveja fresquinha, não se aperceberam logo da chegada ao longe do pregão, entoado no mais afinado dos tons. Mas ele aproximava-se vindo com a maré e parecia não deixar ninguém indiferente à sua passagem. As gargalhadas do grupo na esplanada abafavam o seu conteúdo, todavia, à medida que era mais perceptível o conforto do seu canto, sorríamos ao constatar que o velho pregão da infância ainda perdurava, sobrevivendo aos tempos cibernéticos mais sofisticados. Pois é, este primeiro pregão que apresento lá vai resistindo aos ventos da tecnologia e espalha o seu perfume pelas praias nortenhas. Reza assim: “Olha a língua da sogra?! Chora, chora que a mamã dá! Pipocas...” O homem de branco caminha sobre a areia escaldante, levando às costas um cilindro em latão bege, recheado de bolachas de baunilha, que tão bem sabem quando a fome aperta. Dizem que a praia puxa pelo apetite, não sei se é verdade, mas que a língua da sogra enrolada tem um sabor especial...

Viajando mais para sul o panorama não é muito diferente e o pregão evoca, na mesma, a infância de todos, mas numa variante mais original. No extenso areal da Figueira da Foz, primeiro passou o pregão sénior, em passos vigorosos e embalado numa lengalenga mais repetitiva: “Olha a bolachinha torradinha?! Bolacha americana?!” A surpresa estava ainda para vir, depois de uma meia hora sem pregões por perto, as toalhas foram assaltadas por um rapaz moreno, nos seus dezoito, devo dizer, completamente inspirado, fazendo da praia o seu palco. Os sons primeiros do pregão eram estranhos: “Ksss, ksss... Ksss, ksss...” Toda a gente olhou, mas que raio é isto? Sem ninguém a solicitar os seus serviços, continuava: “Vá lá, vá lá... Não empurrem, chega para todos!” Aí a estupefacção foi total e ninguém podia conter o riso. Mesmo sem freguesia, o rapaz continuava com o espectáculo: “Bolacha americana é fixe e bacana! Já vai, já vai...” Meus caros amigos, o certo é que foi só o rapaz virar as costas e caminhar um pouco mais além e no regresso choveram os pedidos de bolacha americana, inclusive nós, que nem sequer estávamos com muita fome, pedimos a guloseima, fascinados com o pregão!

De Campos

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