quinta-feira, julho 26, 2007

A repetição da dança

Se bem repararmos, a dança é feita de repetições.

Repetem-se os tempos das músicas, repete-se o refrão.

Também se repetem os passos.

"La Danse I" – 1909 - Henri Matisse
The Museum of Modern Art, New York


Porém, a vida não se repete e o nosso tempo é limitado.

Sendo nós mortais, pela lógica as repetições são uma perda de tempo.

Mas as crianças vêem e revêem o mesmo filme e as histórias que já sabem de cor.

Também em adultos continuamos a gostar de repetições.

Acho que a explicação reside no facto de as repetições nos trazerem tranquilidade.

Afinal de contas todos temos medo do desconhecido.

A repetição afasta o medo da incerteza do futuro.

Sei que a dança vai mais além.

Trás a paz da repetição de movimentos.

Mas também trás a possibilidade de inovar, de recriar, de inventar.

Assim, parte do medo instintivo continua lá.

Lembra-me a história do Bocage, quando lhe apontaram uma pistola e perguntaram:

Quem és, de onde vens e para onde vais?

Respondeu na hora:

Sou Bocage, venho do café Nicola e vou para o outro mundo se disparas a pistola.

Se nos fizessem a mesma pergunta, qual seria a resposta?


Fernando Vilas Boas

terça-feira, julho 24, 2007

O baile em 2057

Já há muito tempo que não danço pelos meus próprios pés. Para me facultar uns passinhos calço umas pernas em gel titânico, o último grito em danças de salão, segundo o meu neto. Quem olha para elas, não diria que se trata de muletas de última geração: revestidas por pele artificial, imitam na perfeição os músculos das pernas e seguem com rapidez todos os movimentos que o cérebro quer que executem. Vêm também configuradas com o modo automático, o que permite brilhar no salão, executando os passos de dança mais espectaculares e difíceis.

A pista é translúcida e mesmo por baixo dos meus pés e por cima da minha cabeça giram e rodam pares noutros bailes e noutras pistas. O velho S. Adrião deu lugar a uma mega esfera em acrílico iónico, com lugar para mais de cem salões. À nossa frente tocam as melhores bandas do mundo, as mais antigas e as mais recentes. No meu tempo, ninguém diria que são projecções virtuais e todos ficariam em êxtase por ter um baile com direito a banda e tudo.

Esta não é uma noite qualquer. Faço oitenta e cinco anos. Passei no exame médico, posso ainda bailar, mas com restrições. Ter que dançar com pernas e sapatos mecânicos não é a mesma coisa. Todavia, é difícil ignorar a tecnologia e se não fossem eles não conseguia acompanhar o ritmo frenético desta linda morena. Não devem ser muitos os pares a bailar com autenticidade, aliás, eu nem sei distinguir quem é quem! Humanos e andróides a dançarem no salão. Não há velhos, todos têm um ar jovem e fresco. A eterna juventude a que tanto aspiramos e, no entanto...

De Campos

quarta-feira, julho 18, 2007

Quem é o dançarino?

Olhei de relance e vi um fulano a olhar para mim.

Parei e pensei:

Quem és tu?!

Era a minha imagem no espelho.

Ainda assim mantenho a dúvida.

Sun Tzu escreveu há dois mil e quinhentos anos:

Aquele que conhece o inimigo e a si mesmo lutará cem batalhas sem perigo de derrota; para aquele que não conhece o inimigo, mas conhece a si mesmo, as hipóteses para a vitória ou para a derrota serão iguais; aquele que não conhece nem o inimigo e nem a si próprio, será derrotado em todas as batalhas.

O futuro é sempre uma porta aberta no escuro.

A verdade é que jamais podemos saber as danças que nos esperam.

Talvez por isso olhamos tanto para o que nos falta e não para o que temos.

Talvez por isso pensamos que gostávamos de ser com A, B ou C

Sei que todos podemos melhorar os passos que damos.

Afinal de contas, a vida não tem coreógrafo. Cada qual faz a sua actuação.

Mas só encontramos a paz de espírito quando nos aceitamos a nós próprios.

Por isso, antes de pensar em ser como os outros, acho que devemos tentar ser totalmente nós próprios.

Suponho que é esse o desafio da vida.


Fernando Vilas Boas

segunda-feira, julho 16, 2007

O caos reina

Sentado à frente do computador, naquela que deveria ser a minha secretária, deparo com uma imensidão de papéis, documentos, CDs e livros que eu francamente não sei como foram aqui parar. O caos reina num espaço que me é querido, a minha janela aberta para o mundo está há muito tempo abandonada, é o depósito de muitas coisas que me são essenciais e que por aqui vão ficando sem jeito nem ordem. Demasiadas vezes fiz o solene propósito de pôr este espaço em ordem, mas não passam de promessas que vão adiando o inevitável. Algum dia eu terei que me dedicar a arrumar este valiosíssimo depósito.


O verão esqueceu-se de aparecer, lá fora chove em abundância, as temperaturas oscilam entre o muito quente quando o sol aparece e o fresco húmido do vento norte. Não dá para acreditar que o progresso seja esta aberração abominável feita de um depósito caótico de CO2 na atmosfera. Reina o caos na terra, os pólos derretem, morrem as árvores, os peixes no mar, a vida selvagem desaparece e os poucos animais que conseguiram adaptar-se ao caos humano estão doentes e infectados! Para onde vamos? Será esta a nossa última dança?


De Campos

quarta-feira, julho 11, 2007

Quantas danças mais?

Mandaram-me recentemente uma mensagem, comparando a vida com uma viagem de comboio.

Entram uns, saem outros.

Nunca sabemos quem vai sair a seguir, nem qual vai ser a nossa estação.

O que conta é a atenção que damos aos companheiros de viagem.


Fez-me pensar em quantas danças mais vamos dançar juntos.

Sabemos as danças que fizemos.

Fazemos juntos um trajecto que começamos uns de cada vez.

Podemos até ter começado alguns ao mesmo tempo.

Alguns já saíram do comboio, mas não ficaram esquecidos.

Todos os que partem nos deixam um pouco de si e levam um pouco de nós.

Todos são especiais.

Porém, todas as danças foram boas.

Assim como serão boas as que hão-de vir.

Os desacertos não contam.

O que conta são as pessoas com quem dançamos.

Façamos alegre a dança dos outros, pois eles farão alegre a nossa.

Assim, quando todos tivermos desembarcado, poderemos reencontrar-nos no «Salão de Dança Paraíso».

Cumprimentos e até sexta.

Fernando Vilas Boas

segunda-feira, julho 09, 2007

Na Casca de Ovo

»Quando finalmente troquei algumas frases ao telefone com uma estudante de dança de nome Anna Schwarz, elas resultaram no nosso primeiro encontro. Tudo o que precisei foi de um telefonema.

Por mais difícil que seja recordar-me dos aniversários dos nossos filhos mais novos e netos, ainda me recordo daquela data: encontrámo-nos a 18 de Janeiro de 1953. Para mim – sempre percepcionei factos históricos como batalhas e acordos de paz como se ocorressem no presente – a data em que Bismarck desejou tornar o Segundo Império uma realidade ainda é útil, um facto que me ocorre sempre que me recordo daquele dia gélido – foi num sábado ou num domingo? – e ainda é menos evidente o desenrolar dos factos.

Tínhamos combinado encontrarmo-nos à uma da tarde na saída do metro da estação do Jardim Zoológico. Desde a altura que me tinha aleijado e perdido o meu relógio Kienzle entre Senftenberg e Spremberg, não tinha meio de saber as horas. Cheguei ao relógio da estação cedo, passeava de um lado para o outro, resistia à tentação por um pouco, depois tomava dois copos de água ardente numa banca perto, o que significava que o meu hálito cheirava quando a Anna surgiu à hora, parecendo mais nova do que vinte.


Havia algo de angular e arrapazado na forma como se movia. O nariz dela estava vermelho do frio. O que haveria eu de fazer com esta jovenzita toda a tarde? Levá-la de volta para o quarto de inquilino, onde as mulheres não eram permitidas, não me ocorreria a não ser algo a ser rigorosamente evitado. Poderíamos ter ido ao cinema na rua próxima, em Kantstrasse, mas o oeste lá exibido não me parecia o mais adequado. Por isso eu fiz o que nunca tinha feito antes, convidei galantemente a Fräulein Schwarz a acompanhar-me para café e bolos na Schilling em Tauentzienstrasse, ou terá sido na Kanzler em Kudamm?

Não sei o que dizer de como e onde passámos aquela longa tarde. Devemos ter falado: Qual é a sensação de dançar descalça? Tiveste lições de ballet em criança?

Ou teremos falado dos reis sem coroa da poesia, de Brecht lá para a parte leste da cidade e de Benn aqui no ocidente? Falámos de política?

Ou terei deixado correr, antes da primeira fatia de bolo, assegurado pelo efeito, que eu mesmo era um poeta?

Eu sou como um mineiro do ouro abanando a sua peneira, abano e abano, mas nem uma pepita brilhante, nem um pedaço de fineza, nem um eco de uma metáfora atrevida surge. Nem eu sei quanto bolo ou torta limpámos, e em quantos lugares, listados em qualquer das cascas de cebola. Passámos a tarde de uma forma ou outra.

As coisas não melhoraram até à noite, quando fomos absorvidos pelo famoso salão de então conhecido como o Eierschale (Casca de Ovo). Não é suficiente dizer que dançámos: encontrámo-nos na dança. Olhando para trás, para os dezasseis anos do nosso casamento, tenho que admitir que por mais amavelmente que nos esforçássemos, as únicas vezes que estivemos realmente próximos, como um só, um casal, foi quando dançávamos...

A banda no Eierschale percorria da Dixieland ao ragtime ao swing. Dançávamos todas as danças, dando o nosso máximo. Era como se tívessemos praticado juntos a nossa vida inteira. Um casal dançante feito de céu. Ocupávamos muito espaço. Quase não reparávamos que os outros estavam a olhar. Poderíamos ter continuado por uma pequena eternidade, à medida de braços, face a face, os olhos estabelecendo um pequeno contacto, os dedos pressionando suavemente, inclinando para fora para melhor fundir, rodopiando como um só em pés feitos para rodopiar, brincando com seriedade, para fora e dentro, para cima lá vai ela sem peso, mais rápida que o pensamento, arrastando-se mais devagar que o tempo.


Depois dos últimos blues – era por volta da meia-noite – levei-a ao eléctrico. Ela tinha um quarto em Schmargendorf. A história conta que entre danças eu disse, “Vou-me casar contigo”, e ela disse que tinha um amigo por quem estava seriamente enamorada, o que me levou a dizer, “Não faz mal. Podemos esperar.”

Começos fáceis compensam os tempos difíceis ainda por vir.«



Traduzido por Rui de Campos do inglês Peeling the Onion de Günter Grass, traduzido por Michael Henry Heim e publicado por Harvill Secker.

In Guardian 02.06.07 (Review, p. 6).

quarta-feira, julho 04, 2007

A música da dança

A dança está associada à música.

O movimento acompanha o ritmo do som.

Há melodias que nos agradam mais que outras.

Cada estilo de dança tem a sua cadência.

Há ritmos suaves e harmoniosos que convidam a deslizar pela pista e a sonhar.

A valsa inglesa é típica:

http://www.youtube.com/watch?v=kx7v8PlKwuU

Outros mais marcados, que convidam a saltar e à exuberância.

São sobretudo os ritmos latinos do cha-cha-cha, merengue, salsa, etc.

http://www.youtube.com/watch?v=zeB1bIr8fUg

Há também ritmos pouco dançáveis.

Mas ainda assim tem a sua utilidade.

Há que saber usá-los, com critério.

Por isso:

Aos que criticam para destruir.

Aos que diminuem os outros para se sentirem superiores.

Aos que caluniam para encobrir a sua pequenez.

Aos que se tornam insuportáveis aos outros porque não se suportam a si mesmos.

Podemos dedicar uma musiquinha especial:

http://www.youtube.com/watch?v=dHpSCHxb780&mode=related&search

(Espero que os outros não levem a mal)

Cumprimentos e até sexta.

Fernando Vilas Boas

segunda-feira, julho 02, 2007

Julho Radical

Apesar de chuvoso e incerto o Julho anuncia grandes celebrações para os amantes das danças de salão e das actividades radicais. Neste domingo S. Adrião esteve em festa, animou-se o centro social com danças, em demonstrações e numa roda gigante de casino que contou com a participação de muitos alunos, animados ainda para uns quantos kuduros.


No dia 14 de Julho haverá sempre a possibilidade de um programa diferente, que contará além do pezinho de dança, com muitas actividades radicais. Do centro social de S. Adrião parte-se em caravana pelas 14 horas em direcção a Terras de Bouro para uma guerra de sexos. Não estou a brincar, é esse o nome da actividade radical, para além de muitos jogos populares, uma churrascada já mais para o entardecer e uma sessão de karaoke e baile ao cair da noite. À noite haverá a célebre caipirinha feita in loco pelo afamado cozinheiro de campanha! As inscrições valem 15 euros e podem ser feitas com qualquer um dos professores de dança.

De Campos

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